
Quando é nomeado judicialmente ou quando trabalha como assistente técnico, uma das tarefas essenciais do perito é a vistoria do imóvel. Isso é algo que não se discute. Além dos laudos (provas periciais), é comum que alguns clientes solicitem uma avaliação mais ‘genérica’, denominada Parecer de Mercado. Em algumas situações, tal parecer é pedido com urgência.
Com base nesse contexto, certa vez, uma advogada indicou meus serviços para uma de suas clientes. A cliente me ligou e disse que precisava urgentemente de uma avaliação para o terreno de sua família, que estava em processo de inventário.
Ao ouvir esse pedido de serviço, fiquei duplamente feliz: primeiro, porque recebi a indicação de uma advogada para quem já havia feito um serviço anteriormente; depois, porque com esse novo serviço que se apresentava eu receberia uma remuneração significativa.
A ligação prosseguiu e a cliente mudou um pouco o tom de voz quando falei que precisaria fazer a vistoria e as fotos do local. Ela inclusive disse que se fosse o caso poderia me enviar fotos por WhatsApp. Confesso que num primeiro instante fiquei tentado a aceitar as fotos, pois isso adiantaria meu trabalho. Todavia, o profissionalismo falou mais alto e, depois de agradecer a ajuda, falei que eu fotografaria e faria a vistoria no imóvel.
Ouvindo isso, a cliente mudou a conversa: disse que havia uma casa já “velha” e “caindo aos pedaços” no imóvel. Enfim, fui até o local e, chegando lá, para minha surpresa, havia três edificações, das quais somente uma estava em péssimo estado.
Para agravar um pouco mais a situação, não se tratava apenas de um terreno, conforme informado inicialmente. A cliente me explicou que o meu laudo serviria para contestar o laudo produzido por um oficial de justiça, que havia avaliado aquele imóvel por um “valor extremamente alto”, segundo ela.
Como eu já conhecia a região e diante da conversa duvidosa da cliente ao telefone, pedi o laudo do oficial de justiça. Verifiquei que o valor estabelecido pelo laudo estava dentro dos conformes, ainda que o oficial não tivesse formação específica para realizar avaliação de imóveis. Expliquei para a cliente que por mais que eu pudesse apresentar um valor inferior (dentro dos limites técnicos e da ética) não seria o que sua família buscava. Compreendi depois que o objetivo da cliente era uma avaliação com valor “para baixo”, a fim de pagar menos impostos.
O final desta história não me favoreceu em termos financeiros, pois simplesmente me recusei a fazer um laudo cujo valor seria determinado pelo cliente e não por um método técnico de trabalho. Voltei triste por não ‘pegar’ aquele serviço, sobretudo, porque era um momento em que estava financeiramente no vermelho.
Porém, como se diz, sempre podemos tirar lições das coisas que acontecem em nossa vida, sejam boas ou ruins. Eu ‘perdi’ um serviço fácil, todavia mantive minha dignidade e profissionalismo. E aprendi, de forma inesperada, que a vistoria de um imóvel é algo que o perito precisa sempre fazer!!
Filipe Pêgo Camargos
Professor, Historiador e Perito Avaliador Imobiliário