
Diante das nomeações minhas e de meus colegas, eis que meu amigo, Ozorio, teve a felicidade de ser nomeado para duas avaliações no mesmo município, assim agendamos as duas para o mesmo dia.
No dia da vistoria, saímos bem cedinho, pois a cidade ficava distante, algumas horas de viagem até lá, além disso, eram duas fazendas para visitar. Portanto, sabíamos que seria um trabalho demorado. Mas não contávamos com imprevistos já na saída da cidade: o carro do meu amigo começou a apresentar alguns problemas e como a viagem era longa, não podíamos arriscar. Ozorio telefonou para o seu mecânico, que veio prontamente.
Era algo simples, logo estávamos na estrada. O sol já ia aparecendo, a paisagem bonita, as lavouras, as belezas do caminho. Eu e Ozorio íamos conversando sobre nosso trabalho. Depois de algumas horas, finalmente chegamos à cidade de destino e seguimos para o primeiro imóvel.
O Sr. Henrique já nos aguardava em sua casa; de lá, seguimos juntos para a fazenda. Alguns quilômetros de estrada de chão, muitas curvas, estrada estreita, estávamos cercados de uma natureza exuberante, muitas árvores, um lugar bonito.
Ao chegarmos à primeira fazenda, percebi como era um lugar espetacular, onde se respirava ar puro. Estava instalada ali uma pousada, e tudo era muito bem distribuído, organizado, um lugar mágico. Eu e Ozorio precisávamos fotografar tudo e anotar todas as informações. Então começamos a percorrer as terras. O Sr. Henrique nos mostrava cada detalhe.
Ali ficamos durante algumas horas, almoçamos, retornamos até a casa do Sr. Henrique, nos despedimos dele e seguimos para a outra propriedade.
A próxima fazenda ficava a 60 km da cidade, mais da metade era estrada de terra, não havia movimento, estávamos indo o mais rápido possível, pois havia muito chão pela frente e precisávamos chegar antes do anoitecer para fazer as fotos.
Estávamos no meio do nada, sem barulho, sem carros, só eu e Ozorio naquela estrada, muita poeira, as terras cobertas com lavouras, onde de longe se via o gado leiteiro, característica da região. De repente, passamos por uma pedra pequena, mas que causou um estrago no pneu. Paramos na hora, o resultado foi um corte enorme no pneu.
Falei para Ozorio:
— Agora é trocar o pneu e seguirmos viagem.
Porém ele me olhou assustado e disse:
— Nunca troquei o pneu deste carro, não sei trocar!
Eu não queria acreditar naquilo. Mesmo assim, ele tirou o estepe, pegou o macaco e tentou por várias vezes trocar, mas não conseguiu. Ficamos ali, tentando achar uma solução, mas qual? Ninguém passava e ainda por cima havia um sol forte, o calor era intenso.
Então, tive uma ideia:
— Ozorio, vamos procurar na internet como trocar o pneu deste carro!
Mas o celular dele estava sem sinal, o meu com sinal muito fraco. Mesmo assim, comecei a caminhar para tentar pegar o sinal, até que consegui. Porém, nada dava certo. Foi então que nos lembramos do mecânico e consegui ligar para ele. Ozorio foi seguindo rigorosamente as orientações, e enfim conseguiu tirar o pneu furado e colocar o estepe. Isso depois de uma hora e dez minutos. Agradecemos muito a ajuda e seguimos para a fazenda.
Nestas alturas, já estávamos muito cansados, tensos e preocupados, porque o tempo passava rapidamente. Mas enfim chegamos à fazenda e o proprietário em seguida nos levou para fazer as fotos, afinal estava escurecendo. Nem tínhamos mais muita vontade de conversar, queríamos terminar a vistoria e voltar, pois sabíamos que ainda havia algumas horas de viagem até chegarmos em casa.
Quando voltamos para a casa do proprietário da fazenda, a esposa dele educadamente nos ofereceu café, pão de queijo e bolo. Como resistir? Estávamos famintos, cansados e aquele café, que lembrava a infância, o bule em cima do fogão a lenha, a leiteira também em cima daquele fogão a lenha.
Neste momento, por alguns segundos, me esqueci de todo cansaço e de toda preocupação e só lembrava da minha infância, até o cheiro do café era algo incrível. Lembranças da casa dos meus avós, dos meus pais. Em segundos, meu coração se encheu de alegria; uma saudade dos tempos de criança.
Como explicar o que nós Peritos passamos durante uma avaliação? Acredito que uma mistura de imprevistos, surpresas, adrenalina, alegria, tensão, cansaço, preocupações e muita emoção. Encontramos pessoas capazes de nos oferecer algo que aparentemente pode ser simples, mas que nos faz reviver bons momentos e nos faz lembrar que, apesar das dificuldades, apesar dos riscos, tudo vale à pena.
Silmara Gottardi
Wow! Quanta emoção num só dia!
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Boa tarde. Suas informações iniciais sobre a beleza da primeira fazenda, me remeteram a um pedido de um pequeno sitiante que pretendia vender sua propriedade. Procurou, então, o Sr. Olavo Bilac (se não me falha a memória) para solicitar-lhe fazer um anúncio da venda e pubica-lo. Passados algumas dias, os dois se encontraram. O Bilac perguntou: e, então, vendeu o sitio? Ao que lhe respondeu: com tanta coisa maravilhosa, a natureza exuberante, águas cristalinas, riacho pidcoso etc , não me restou opção, apenas desfrutar dessas maravilhas.
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Lembro dessa história, Olavo Bilac descreveu com tanta emoção o sítio, que o proprietário enxergou as belezas do seu sítio e não quis mais vendê-lo. Obrigada, José Carlos e um forte abraço!
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Como sempre brilhante. Fui longe com a narrativa, bateu uma saudade da fazenda do meu avô, café no bule, bolo de milho e biscoitos de queijo…
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Obrigada, Francisco! Realmente as vistorias nos fazem viajar no tempo em algumas situações. Nosso trabalho é maravilhoso, não é mesmo? Abraço!
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O seu texto me fez recordar de uma situação parecida que vivi.
Muito bom.
Parabéns.
Gustavo Labares.
http://www.labares.com.br
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Bom dia, Gustavo! As vistorias sempre são diferentes, nós Peritos temos o privilégio de viver cada dia uma história! Grande abraço!
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