
Eu estava diante de mais um trabalho, era uma avaliação judicial para a qual um parceiro de trabalho, o Rafael, havia sido nomeado.
Depois de todo procedimento burocrático lá fomos nós para a vistoria dos dois imóveis. Ficavam no mesmo bairro de uma cidade da região metropolitana. Como agendamos para às 9h, tivemos que sair bem cedo, pois além da ditância, sabíamos do trânsito intenso que pegaríamos e nessa situação é fundamental sair com tempo para não atrasar o trabalho e desrespeitar o horário agendado e peticionado nos autos.
Chegando no imóvel e já com tudo agendado antecipadamente, conforme é exigido em avaliações judiciais, dona Antônia, proprietária do imóvel, se espantou com nossa presença, pois não sabia que tínhamos marcado a vistoria. Ela ficou olhando sem entender nada, disse que ninguém falou nada pra ela sobre tirar fotos do imóvel naquele dia.
Rafael mostrou a nomeação e o agendamento, explicou que havia agendado há alguns dias. Então a mulher, ainda um pouco desconfiada, mas muito educada, perguntou se podia ligar para a advogada, e assim fez.
Ficamos surpresos ao ouvir que a advogada não havia lido nos autos a petição com dia e hora marcados para a vistoria. Nos deparamos com uma situação constrangedora, pois meu amigo fez o correto, agendou antecipadamente, mas deixaram de ler.
Conversamos tranquilamente com dona Antônia, explicamos a nossa situação, que morávamos longe e que, além disso, tinha sido marcado e seria bem complicado fazer novo agendamento e ainda ter que justificar a prorrogação da vistoria. Foi então que a mulher nos compreendeu. Ela era bem simples, pessoa que batalha para viver. Nos pediu desculpas pelo ocorrido e disse que nos deixaria fotografar e fazer toda vistoria.
Antes de começarmos, eu fiquei observando aquela mulher. Ela falava conosco e ao mesmo tempo tinha um olhar distante, mãos um pouco trêmulas e o semblante de preocupação. Nesse momento, o Perito precisa ter extremo cuidado, porque não é só fotografar um imóvel e anotar a descrição, é muito mais que isso: é observar uma vida, ter discernimento para saber continuar ou recuar. Ter sabedoria para saber usar as palavras certas, entender que não é só o imóvel, há vidas, há um passado, uma história.
Começamos a vistoria, mas isso eu conto na próxima crônica, porque as surpresas não pararam por aí. Tivemos mais histórias e coisas peculiares neste trabalho.
Aguardo você!
Silmara Gottardi