A casa dos avós – uma avaliação especial

Certo dia, precisei fazer uma avaliação de imóvel sozinha porque Luca estava viajando. Inicialmente, estranhei um pouco, pois me acostumei a trabalhar em parceria com ele, entretanto o dever me chamava.

Esse trabalho foi indicação de um amigo, que nos ligou informando o número de telefone do cliente para agendarmos uma visita. Até então, tudo bem. Mas, quando eu soube o nome do cliente em questão, simplesmente fiquei estática, afinal era uma pessoa bastante conhecida, autor de vários livros. Eu mesma sempre fui sua fã por se tratar de um grande educador. E agora prestaria serviço para esse homem.

Confesso que não foi fácil fazer a ligação; quando ele atendeu, tive que respirar fundo e realizar meu trabalho, que consistia inicialmente em marcar dia e o horário para fotografar e vistoriar o imóvel. A visita foi agendada para o dia seguinte.

Fui para casa pensando na tal avaliação. À noite, o sono não vinha e a ansiedade aumentava. Eu sei que nós avaliadores de imóveis devemos ter sempre uma postura ética e profissional, mas esse era um cliente singular, o qual admiro desde minha adolescência e com o qual de repente ficaria frente a frente.

Na manhã seguinte, acordei cedo, me arrumei, tomei café e me dirigi ao endereço marcado. A expectativa era imensa! Chegando ao local, em seguida, meu cliente apareceu. Apresentamo-nos e o tratei formalmente – embora a vontade fosse de pedir autógrafo, fazer selfie e dizer o quanto ele fez a diferença na minha vida escolar. Mas, mantive a discrição.

O cliente mostrou-se gentil e atencioso. Entramos no imóvel e ele me explicou que ali fora a casa de seus avós. Senti-me em um ambiente mágico. Atrás de cada porta, ele ia narrando suas histórias de infância: a intensa convivência com os avós, os encontros familiares, o cheiro da comida de sua avó, que ele dizia sentir ainda hoje. Contou-me sobre as brincadeiras, os locais da casa em que costumava se esconder, o pátio onde corria com seu irmão e seus primos. Havia um carro antigo na garagem – com certeza de seu avô.

Aquele cliente, tão especial para mim, demonstrou ser uma pessoa simples e humilde, mesmo com toda sua sabedoria e tendo estudado tanto. No decorrer da visita, percebi que estava diante de um ser humano de grande coração, narrando-me momentos em que fora feliz na casa de seus avós.

Fotografei e anotei toda a descrição do imóvel, afinal foi para isso que fui chamada. Porém, era difícil não ouvir e sentir aquelas histórias. Tudo parecia ser tão especial para ele; percebi seus olhos atentos e mergulhados no passado em cada canto daquele imóvel.

Terminamos a vistoria. Ao me despedir e sem pensar muito, falei-lhe da honra que estava sendo para mim poder atendê-lo, que já o conhecia e sempre o admirei, que achava incrível seu trabalho. Parabenizei-o pelo lindo ofício desenvolvido ao longo de sua vida. Ele sorriu e agradeceu educadamente num longo cumprimento.

Dali, cada um seguiu seu caminho. Eu estava simplesmente maravilhada com tudo e muito feliz. Minha profissão me proporciona momentos indescritíveis, algo que não tem preço. Fui caminhando lentamente pela calçada até o estacionamento, agradecida a Deus pelo meu trabalho, pelo sustento da minha família e pela oportunidade de poder conhecer tantas pessoas diferentes, cada uma com sua história de vida.

Silmara Gottardi

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